Quais são os livros que contribuíram para a formação da pessoa que você é hoje?
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Escreva nos comentários os nomes desses livros e um breve depoimento (se quiser) ou envie para linguagensporperto@gmail.com.
De williamaragao1807:
O primo Basílio de Eça de Queiroz é um maravilhosooo livro. Me vonlutariei a fazer uma readaptação em peça teatral para um evento no ensino médio e todos amaram. Super indico, ate mesmo para aqueles que acham que a literatura é chata e eu era um desses.
De Angela Ignatti:
São tantos os livros inesquecíveis, difícil colocar aqui um, mas aí vai: meu livro inesquecível é... Grande Sertão Veredas, de Guimarães Rosa. Marcou-me muito; eu tentei lê-lo quando tinha uns 19 anos, mas achei muito chato; resolvi encarar o desafio novamente aos 35 anos, e foi um verdadeiro assombro mergulhar na prosa e no nesse sertão místico e universal criado por Guimarães. A linguagem que o autor utiliza é uma viagem à parte, mas conhecer a alma de Riobaldo, de Diadorim e de outras personagens incríveis foi uma experiência única. (...) “Sertão é isto: o senhor empurra para trás, mas de repente ele volta a rodear o senhor dos lados. Sertão é quando menos se espera.”(...)“Sertão é o sozinho.”(...)“Sertão: é dentro da gente.(...)”.
De Fernanda Lunkes:
Um texto que escrevi sobre um livro que me marcou profundamente: "As formas do silêncio: no movimento dos sentidos", de Eni Orlandi:
O silêncio: um tema relevante
Na música “O silêncio”, Arnaldo Antunes nos inspira a refletir especialmente sobre o silêncio. Destaco aqui o trecho “O silêncio/foi a primeira coisa que existiu”, que nos adverte para uma questão aparentemente tão natural e que, por isso mesmo, atua de forma óbvia para nós: antes do dito, é o silêncio que se coloca.
Algumas perguntas, porém, começam a deslocar nosso imaginário de obviedade sobre o silêncio para situá-lo em sua opacidade: Como compreender e analisar o silêncio? Trata-se de um vazio que contém todos os sentidos ou está desprovido de qualquer significado? O silêncio é uma materialidade? Como funciona em nossas práticas linguageiras? Como se pode depreender, diante dessas questões há que se responder contemplando a complexidade dos questionamentos e dos processos. Pode-se, assim, imaginar o quão desafiadora é a tarefa quando se alça o silêncio à condição de objeto.
Esse desafio, no entanto, é assumido brilhantemente pela professora e pesquisadora Eni Orlandi, que se dedica a compreender o funcionamento do silêncio no livro “As formas do silêncio: no movimento dos sentidos”, de 2002 (5ª edição), publicado pela Editora da Unicamp, obra congratulada com o prêmio brasileiro Jabuti em Ciências Humanas.
Na esteira teórico-metodológica da Análise de Discurso, a autora nos leva a compreender o silêncio a partir de uma perspectiva que o mobiliza enquanto fator de significação e que produz um deslocamento de sua compreensão e funcionamento no escopo dos estudos linguísticos, cujas análises o concebem de diferentes formas: implícitos, elipses, figuras de linguagem, sem atribuir o caráter material tal como defendido pela autora.
Em sua exposição e compreensão sobre/do silêncio, a autora não traça apenas o caminho a fim de mostrar como concebe a noção, mas retoma diversos autores e teorias para colocá-los em relação, questão cara à autora nos estudos que desenvolve. Seu posicionamento de não colocar o silêncio em relação ao dito, porque o silêncio permanece, é tão sensível quanto profundo.
Nessa obra, a autora faz uma distinção importante entre silêncio e silenciamento: há uma diferença fundamental entre o funcionamento constitutivo das palavras – silêncio – e entre se colocar em silêncio – que é um processo de silenciamento. Trata-se, neste último caso, de uma política do silêncio, quando as palavras nos são tiradas, quando somos obrigados a dizer o que não queremos ou quando somos obrigados a calar. São várias as possibilidades, mas todas nos colocam, em última instância, entre silêncio e poder/dever dizer.
A autora propõe em sua obra diferentes funcionamentos para o silêncio. O primeiro é o silêncio fundador, que não significa origem ou totalidade, mas que aponta para um silêncio presente nas palavras e que produz as condições para significar. O segundo funcionamento é a política do silêncio, que se subdivide em silêncio constitutivo e silêncio local. O silêncio constitutivo permite considerarmos que, ao dizer, estamos necessariamente apagando outras palavras. Já o silêncio local refere-se aos processos censórios, aquilo que se proíbe de dizer em uma determinada conjuntura.
A obra não pretende prender o silêncio, torná-lo visível. Como afirma a autora: “o silêncio não está disponível à visibilidade, não é diretamente observável. Ele passa pelas palavras. Não dura. Só é possível vislumbrá-lo, de modo fugaz. Ele escorre por entre a trama das falas” (p. 34).
Afirmando que o silêncio é o “real do discurso”, Orlandi convida analistas de discurso e outros leitores interessados a compreender as especificidades e os funcionamentos do silêncio em um texto extremamente sensível e denso. É uma obra que certamente produzirá efeitos em nossas relações de/com a linguagem. Não é nada espantoso se houver o desejo e/ou a necessidade de ler o livro mais de uma vez.
Eni Orlandi é uma pesquisadora que dispensa apresentações entre linguistas e analistas de discurso. Principal nome da Análise de Discurso materialista no Brasil, seu extenso currículo a coloca como nome obrigatório nas obras referentes à vertente teórica formulada pelo núcleo constituído por Michel Pêcheux, na França, cujas pesquisas ganharam fôlego sobretudo nas décadas de 1960-1970. A presente obra é uma daquelas leituras imperdíveis também por tratar, teórica e analiticamente, um tema tão presente, mas, ao mesmo tempo, tão enigmático em nossas vidas. E conseguir aliar a um tema como esse a densidade teórico-analítica necessária para contribuir à área com a poesia inerente ao tema é tarefa para poucos, feito este alcançado com êxito nessa obra.
A primeira edição de As formas do silêncio é de 1993. Somam-se quase 30 anos de uma obra que parece ignorar a passagem do tempo e que se mantém atual e relevante. Em tempos digitais, em tempos de recrudescimento de discursos fascistas e censórios, em tempos de práticas militantes de grupos historicamente segregados, uma obra que coloque o silêncio como objeto é uma leitura mais do que teórica: trata-se de uma reflexão fundamental para como concebemos e assumimos, mais do que os dizeres, o silêncio e o(s) silenciamento(s).
De Keila Araújo:
Ainda na graduação, li o livro Modernidade líquida, do filósofo e sociólogo Zygmunt Bauman. Foi um divisor de águas e eu nunca mais olharia com ingenuidade para a movimentação político-social presente na investida ramificada e constante pela mercantilização das vidas. O autor nos leva a compreender como agem as estruturas de poder, cada dia mais impalpáveis, velozes e violentas. Sem dúvidas, uma leitura que instiga muitas outras. É um início, reinício.